Alquimia Interior: as etapas do desenvolvimento alquímico
Ao iniciar os estudos herméticos, em especial o que se refere à Alquimia, muitas pessoas se perguntam o que vem a ser a tão falada “Pedra Filosofal”. Para responder de uma maneira que os estudantes entendam melhor, faz-se necessário compreender, antes, em que consiste o processo alquímico, em especial, aquele destinado à transformação da personalidade do homem.
De acordo com Juan Carlos Romera, a “Alquimia é a arte e ciência que visa a transformação do corpo e da mente com a finalidade de converter o indivíduo que a pratica em um canal para uma nova consciência”.
Consciência essa que, ao contrário da que está presente no homem dialético, possui uma percepção de unidade, ou seja, em que a unidade é característica fundamental. Resumindo, queremos dizer que o homem dotado dessa nova consciência percebe o elo indivisível entre o Criador, a Natureza Humana e o Universo. Essa nova percepção, esse novo “Estado de Ser”, foi concebido pelos antigos como a descoberta e desenvolvimento da Pedra Filosofal.
Talvez você se pergunte de onde vem esse nome e qual sua relação com o processo de transformação do homem velho no novo homem. Sabemos que antigamente os símbolos eram usados amplamente pelos alquimistas, uma vez que as perseguições da Igreja eram comuns na época. Assim, os operadores da Sagrada Arte utilizavam imagens e palavras carregadas de significados que só eram claros para os iniciados.
Nigredo, Albedo, Rubedo
No caso do nome “Pedra Filosofal”, vejamos o porquê: pedra em hebraico quer dizer EBEN, sendo que a primeira parte da palavra é constituída pelas letras ALEPH e BETH, formando a expressão AB, que se traduz como “Pai”. A segunda parte da palavra é formada pelas letras BETH e NUM, que formam a expressão BEN, que quer dizer “filho”.
Diante disso, Pedra Filosofal remete ao conceito místico de “união do Pai com o Filho”, conceito esse repetido inúmeras vezes na Bíblia Cristã. Particularmente, veja essa “união” como o nosso reencontro com a divindade, através do processo de transformação realizado na Grande Obra.
Encontrar ou atingir a Pedra Filosofal é, do ponto de vista alquímico, reconhecer em si mesmo ― e em tudo o que há na Natureza e no Universo ― a Consciência Superior Interna, o verdadeiro EU SOU em nosso interior. Quando o alquimista empenha-se em transformar o chumbo em ouro, ele está empenhado em transmutar o homem de chumbo no homem de ouro.
Em outras palavras, a intenção é buscar o reconhecimento da vida divina no interior, e não de uma vida dirigida pela matéria e pelos sentidos físicos. Significa mudar um estado de consciência que é pesado e limitado em outro resplandecente e brilhante.
Uma vez atingida essa nova percepção da vida, encontramos a Pedra Filosofal. Parece simples, mas não é. Esse encontro, essa transformação não é possível sem o processo de morte. É necessário a morte do velho para o nascimento do novo e, na Alquimia, essa morte compreende a primeira etapa do processo alquímico, que se chama Nigredo. Adiante falaremos mais sobre ela.
Enquanto homem velho, pesado e arraigado na matéria, somos o chumbo ― metal associado à Saturno que traz a ideia de estado inferior, em que a consciência humana se vê limitada às condições do tempo e do espaço. Podemos entender o chumbo como estado de ser mergulhado na ignorância a respeito da nossa natureza divina.
O homem de chumbo sofre indefinidamente porque, como diz Pimandro no Corpus Hermeticum, ele não está consciente da sua absoluta imortalidade e do seu poder sobre todas as coisas; e ainda assim, quando adquire essa consciência, sofre o destino dos mortais em razão de estar submetido ao “factum”. O homem velho, de chumbo, associado à Saturno, precisa renascer e, para isso, a morte é inadiável.
Enquanto o chumbo remete à Saturno, ao velho, ao pesado e à ignorância; o ouro é um metal solar, que tem a conotação de integração. O Sol, astro central do nosso sistema planetário, representa a fonte de vida e a regeneração constante da espécie humana. Por isso, associa-se o chumbo ao homem ignorante, não transformado; e o ouro ao homem reintegrado, transformado pelo fogo interior.
Uma vez que o alquimista possui o poder renovador funcionando em seu interior, pode-se dizer que ele, por meio do Amor Incondicional, integra sua personalidade e, graças à aplicação dessa força, chega ao ponto em que atingirá plena saúde física e mental.
É nesse momento que ele descobre o famoso “Elixir da Longa Vida”, que é nada menos que o resultado do reconhecimento de sua essência eterna e infinita. O mais interessante é que, de posse dessa nova consciência, ele poderá recodificar seu próprio corpo físico, libertando-o da prisão da carne, ou seja, dos resíduos da genética animal que o condena à morte e ao renascimento.
O processo de transmutação alquímico que mencionamos no início do texto, que tem início com a morte do homem de chumbo, tem como objetivo final a Grande Obra, que é finalizada quando o alquimista tem sua integração com o Cosmos e o Criador.
É quando seu corpo chega a um estado de total espiritualização. Em outras palavras, ele se liberta e ascende, através dos planos de existência, em direção a um “Estado de Ser” em que as condições são de plena bem-aventurança e em comunhão com o eterno.
É importante ressaltar que existe a Alquimia Externa e a Alquimia Interna. Neste texto, estamos tratando da segunda, que é aquela que visa a transmutação da personalidade do alquimista. E existem, neste caso, três etapas básicas no desenvolvimento alquímico que todo estudante de Alquimia deve conhecer.
São elas: NIGREDO (mencionado anteriormente), ALBEDO e RUBEDO. Vamos falar também sobre uma quarta etapa, chamada CITRINITAS, que não é reconhecida por todos, mas que merece também ser citada.
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Nigredo (Morte Espiritual)
Como dito, o nigredo é a etapa da ignorância, em que o homem passa por um crítico despertar. Também chamada de “Operação Negra”, ela compreende a fase em que a matéria é dissolvida e entra em putrefação. É quando a matéria “deixa de ser”. A ave que simboliza esta etapa é o Corvo. O elemento é a terra.
Como estamos tratando da Alquimia Interior, precisamos compreender essa dissolução como a morte do ego ilusório ou, como gosto de dizer, deixar para trás nosso velho “eu”, cheio de conceitos que não são nossos e uma enxurrada de informações que não nos serve no caminho da evolução.
É a morte, a putrefação dos antigos padrões habituais de comportamento, que permite o alvorecer de um novo estado, no qual nossa verdadeira natureza se revela, o ALBEDO.
A verdade é que, nesta etapa, olhando do ponto de vista espiritual, o neófito ― alquimista no início da Obra ― passa por uma morte e também uma ressurreição. Ocorre um conflito, uma batalha que se estabelece dentro dele, entre os princípios opostos conhecidos como consciente e inconsciente.
Para obter a matéria-prima, ele precisa visitar seu interior, seu próprio caos ou, como dizia Jung, suas “águas primordiais”; ou ainda, o Akasha ou Éter de onde a vida iniciou para encontrar a Pedra Oculta, a Alma ou Animus e assim, posteriormente, iluminada pelo Espírito, transformar o corpo material em Corpo Glorioso, Iluminado, Consciente, Imortal. Essa é a morte necessária, seguida da ressurreição. É um ato de descer aos infernos para elevar-se aos céus.
Ao começar a estudar alquimia, muitas pessoas se perguntam sobre esse processo de transmutação interior. Resumindo tudo o que foi dito, ele consiste em voltar-se para si mesmo, para o interior e, cara a cara com a obscuridade encontrada, libertar-se de tudo o que é corrupto e corruptível. É a morte do ego. A morte que antecede a ressurreição.
Esse processo de visita interior, lembra-nos da sigla V.I.T.R.I.O.L (Visita Interiora Terrae Rectificando Invenies Occultum Lapidem), que quer dizer exatamente: Visita o Interior da Terra Retificando-te, e encontrarás a Pedra Oculta.
Albedo (Purificação)
Vimos que a etapa anterior representava uma espécie de descida ao inferno ou, como simbolizado no V.I.T.R.I.O.L, uma visita ao Interior da Terra, o Interior de Si Mesmo. Essa visita tem como finalidade encontrar a Pedra Oculta. No Nigredo o neófito passa por uma morte simbólica. Não é difícil de presumir que a etapa do Nigredo é presidida por Saturno, que com sua foice sacrifica a matéria, também representando a Noite Saturnina.
A etapa seguinte é chamada ALBEDO, simbolicamente presidida por Júpiter que, no campo espiritual, está associado à ressurreição ou à ascensão aos céus. Após a viagem ao Interior da Terra, a alma eleva-se, ressurgindo da noite do caos e desenvolvendo sua força máxima. A Consciência cheia de vida vence a morte.
Esta etapa é também chamada de Operação Branca, que é quando a substância passa por diversos processos de purificação até se tornar uma substância pura. A ave que simboliza esse processo é o cisne branco. O Elemento é a água.
Espiritualmente falando, ALBEDO está relacionado à incorporação da Luz Absoluta pela própria individualidade, que leva ao rejuvenescimento do corpo e, posteriormente, à sua espiritualização. Após lavar-se, purificar-se ou, como o processo indica, branquear-se, o alquimista está, então, preparado para a unificação, tornando-se um “Ser Imortal” ou “Homem Regenerado”.
Citrinitas (Despertar)
Esta etapa é representada pela Águia Amarela. Neste estágio ocorre a conversão da prata em ouro no seu sentido literal. É o chamado “despertar da matéria”. É o discipulado, quando o processo está quase concluído, faltando apenas chegar à excelência.
Rubedo (Iluminação)
O estágio final, RUBEDO, traz um mundo novo. Representado pelo pelicano, também é conhecido como “Operação Vermelha”. É quando a consciência cósmica do alquimista se estabelece definitivamente. Nesta fase, ele obtém o contato pleno com a eternidade e a retificação total da alma. É quando a obra é concluída.
Esta é a finalização da Grande Obra, do ponto de vista espiritual. É quando o Espírito une-se em casamento com o corpo após este ser resgatado e purificado. Ocorre em ALBEDO a transmutação espiritual de um “corpo obscuro” (chumbo) em um corpo iluminado (ouro). Esse é a verdadeira crisopeia.
Simbolicamente falando, trata-se da passagem da Lua para o Sol, da Psique para Eros, da Anima para Animus. Assim, o corpo regenerado faz-se imortal, como uma chama que nunca se apaga.
Nicholas Flamel na culminação da Grande Obra, afirmou: “(…) É como um leão que devorasse toda a natureza impura e metálica e a transformasse na sua própria substância, quer dizer, em ouro verdadeiro, mais puro do que o das melhores minas (…)”.
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Que legal Lidiane, quer dizer, é mais que legal, claro. Mas, gostei muito do artigo. Estudo muito sobre as questões espirituais e venho nesse trajeto para a ampliação da consciência, já há algum tempo. Gosto muito das leituras com Jung – atualmente estou lendo Psicologia e Religião. E gosto muito da sua página, ali, vou encontrando algumas referências e depois vou buscar me aprofundar. Tenho muito interesse pelos símbolos e trabalho com a imaginação ativa (em mim) desde muito nova. Enfim, vou me manter conectada aqui para saber mais. Grata por partilhar conosco desses conhecimentos!
Olá Kátia! Obrigada pelo feedback aqui também! 🙂 Estou junto com você nesta busca, nos estudos e sempre me encanta e impressiona a vastidão de conhecimento e sabedoria que foram passadas pelos antigos. E o melhor, conhecimentos mais que atuais. Nos vemos neste caminho e muito obrigada pela força! Abraços!
Kátia! Eu agradeço demais o comentário e peço perdão pela demora na resposta. Sua página também é excelente!
Abraços!